No lugar sobranceiro a Alfama onde hoje está sedeado o Centro de Estudos
Judiciários, existiu outrora um paço que terá servido de residência real desde
o tempo de D. Afonso III.
Esse edifício teve, ao longo da história - por vezes, em simultâneo - várias
denominações. Foi "Paços de a-par-de S. Martinho" por se situar em frente
da igreja paroquial que tinha como orago o referido santo – tida por uma das
mais antigas de Lisboa – e também "Paço dos Infantes", denominação
devida a nele terem habitado, ou os filhos de D. João I, ou os filhos de D.
Pedro I e de D. Inês de Castro, os célebres D. João e D. Dinis, segundo Júlio
de Castilho.
Outra denominação foi a de "Paços da Moeda". É sabido que a oficina dos
moedeiros, no tempo de D. Dinis, funcionava no Campo da Pedreira, no
Bairro de Alfama, junto às casas da Universidade. Com a transferência para
Coimbra, no ano de 1308, do Generale Studium, os moedeiros ficaram a
ocupar-lhe o lugar. Regressada a Universidade a Lisboa, em 1338, a oficina
de fabrico de moeda foi instalada nos "Paços de a-par-de S. Martinho – em
parte deles ou em edifício contíguo –, o que originou a nova denominação
"da Moeda".
O Rei D. Pedro I, nas suas deslocações à cidade de Lisboa, pousava nos
Paços a-par de S. Martinho, preferindo-os aos da Alcáçova. O sucessor de D.
Pedro revelou idêntica predilecção, tendo o referido Paço Real servido de
residência a D. Fernando e D. Leonor Teles.
Durante a crise de 1383-1385, o Paço Real de a-par-de S. Martinho foi o
cenário de acontecimentos dramáticos, narrados magistralmente pelo
cronista Fernão Lopes: aí teve lugar, em 6 de Dezembro de 1383, o
assassínio de João Fernandes Andeiro, conde de Ourém, às mãos de D. João,
Mestre de Avis, e de Rui Pereira, numa sala contígua à câmara régia. O novo monarca utilizou o paço como residência durante algum tempo,
enquanto não acabavam as obras que mandara realizar nos Paços da
Alcáçova. No entanto, no início do século XV, o local já ganhara mais uma
denominação: a de "Paços do Infante herdeiro", por ser local de residência
do infante D. Duarte.
Por essa altura, numa parte das dependências do paço, estavam instaladas
as Comendadeiras do Mosteiro de Santos-o-Velho, de que era superiora Inês
Pires (ou Peres), de quem D. João I tivera, fruto de amores juvenis, dois
filhos: D. Beatriz de Portugal e D. Afonso, que veio a ser conde de Barcelos e
1º duque de Bragança.
Há notícia de que, em meados do século XV, residiram neste paço as irmãs
de D. Afonso V – uma delas a infanta D. Leonor, futura imperatriz da
Alemanha pelo seu casamento com Frederico III.
No tempo de D. João II, o Paço de S. Martinho, sede do Desembargo do
Paço, já funcionava como cadeia e ganhara um novo nome: Paço do Limoeiro
ou, mais simplesmente, Limoeiro, em alusão a uma árvore que existia –
supõe-se – no local e caracterizava o sítio.
D. Manuel I empreendeu importantes obras no paço. Conta Damião de Góis,
referindo-se ao monarca: "Fez de novo em Lisboa junto da igreja de São
Martinho os Paços da Casa da Suplicação e do Cível, e cadeia do Limoeiro,
obra muito magnífica, e sumptuosa, onde dantes fora a casa da moeda (...)."
Foi assim, com esta dupla função de cárcere (em baixo) e de Tribunal (nos
pisos superiores), que o Limoeiro se manteve até ao século XVIII.
Ao Limoeiro, onde existiam duas cadeias distintas (a Cadeia da Cidade e a
Cadeia da Corte) eram conduzidos todos os condenados ao degredo nos
territórios ultramarinos, a fim de aguardarem nas suas enxovias o dia do
embarque.
Depois de ter recebido beneficiações no tempo de D. João V, o Limoeiro ficou
seriamente danificado na sequência do grande terramoto de 1 de Novembro
de 1755, que causou a derrocada total da Cadeia da Cidade e parcial da Cadeia da Corte, havendo notícia de que os presos se puseram todos em
fuga. Apesar da severidade dos danos, o prior da paróquia de S. Martinho,
respondendo ao inquérito efectuado, em 1758, aos diversos párocos da
cidade, indicou terem morrido na área da sua paróquia, vitimadas pelo
terramoto, apenas trinta pessoas. Na mesma resposta, o prior informa que a
Cadeia da Corte já estava, ao tempo, reabilitada.
Do edifício do Limoeiro foram retirados os tribunais da Casa da Suplicação,
transferidos para as casas históricas dos condes de Almada, junto ao Rossio.
No século XIX, pensou-se, segundo Júlio de Castilho, "na edificação de uma
boa cadeia pública, segundo as normas da higiene, e as prescrições da boa
polícia moderna". Realizadas as obras, o edifício ficou, a partir daí, com uma
configuração exterior já próxima da actual.
O poeta Pedro Correia Garção (em 1771), o poeta Barbosa du Bocage
(1797), o pintor Domingos Sequeira (1808) e o escritor Almeida Garrett
(1827) foram algumas das personalidades de vulto que conheceram os
cárceres do Limoeiro.
É negro o quadro traçado por Oliveira Martins, reportando-se ao Limoeiro no
tempo do terror miguelista: "Os homens eram amontoados, empurrados a
pau para a sociedade dos assassinos, nessas salas imundas, habitação de
misérias informais. Davam-lhes sovas de cacete miguelista, e por dia um
quarto de pão e caldo, onde flutuava, raro, alguma erva" (Portugal
Contemporâneo).
Nos finais do século XIX e inícios do século XX, multiplicaram-se as críticas
ao funcionamento da cadeia do Limoeiro, referida por Francisco de Melo e
Noronha como "a escola repugnante de todos os vícios, a nódoa imunda que
envergonha a nossa capital aos olhos dos estrangeiros (...)".
Atingido por diversos incêndios, como os de 1918 e de 16 de Maio de 1933,
as obras de reconstrução e remodelação do edifício prolongaram-se pela
década de 1940.
Texto retirado da pagina do centro de estudos Judiciários
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